Como ser voluntário em parques que trabalham com a preservação de animais selvagens?
Foto: Marilena Cantizani. |
A África do Sul recebe turistas de todo o mundo que pagam para ser voluntários em reservas e fazer todo o tipo de serviço comum a esses locais.
Estamos sempre abordando
temas relacionados aos animais de estimação, porque esse é realmente o nosso
principal foco. Mas tem um assunto que surgiu por meio de conversas sobre
viagens de entrevistados que é muito bacana. Na África do Sul são comuns os safáris
pelas savanas cujo objetivo passou a ser, aparentemente, muito mais a
contemplação e fotografia de animais selvagens do que a caça. Infelizmente isso
não é tão verdade assim.
Mas além dos safáris,
outra atividade de turismo comum tem sido os projetos voluntários naquele País
em parques e reservas que oferecem diferentes tipos de trabalho em prol da
preservação das espécies e dos locais que os abrigam. A experiência pode ser
muito gratificante e, certamente, inesquecível.
Contudo, é necessário
pesquisar bastante antes de se aventurar, pois existem locais onde os animais
aparentemente são muito bem tratados, mas por trás de toda a beleza e de todo o
trabalho, estão pessoas que mantém animais dopados, que estimulam a procriação
com fins meramente comercias e outras coisas que uma das nossas entrevistadas
vai nos contar. Tudo para garantir o lucro que a visita dos bem intencionados
amantes dos animais oferecem durante todo o ano.
Primeiro vamos conversar
com Vanessa Norcia Serrão, paulista,
residente no Rio de Janeiro. A Vanessa foi uma das primeiras entrevistadas do
Cãopetente. Mas com o bate-papo, descobrimos uma infinidade de
assuntos voltados para o mundo que amamos, dos animais. Hoje vamos contar sua
experiência durante a viagem que fez à África do Sul para ser voluntária no
Seaview Predador Park.
Cãopetente – Vanessa, conte-nos sobre como lhe
ocorreu a ideia de viajar à África para trabalhar voluntariamente com animais
selvagens.
Vanessa
Serrão - Em 1998 fui à África do Sul como turista e tomei
conhecimento do trabalho voluntário. Durante anos planejei participar de um
projeto desses, até que em 2011 resolvi ser voluntária no Seaview Predador Park. Na África do Sul é muito comum
o voluntariado na vida selvagem e existe em diversos parques com vários
animais.
Cãopetente – Como era sua rotina no Parque?
Vanessa
Serrão - Tinha uma
rotina bem puxada. Para citar um exemplo, os tigres de um mês precisavam ser
alimentados muito cedo, então eu praticamente madrugava para dar mamadeira a
eles. E não era só a parte boa de cuidar dos animais. Eu era responsável por
recolher as fezes dos sete leões jovens, além de cuidados básicos como
alimentação, higiene e lazer dos leões, tigres e demais bichos envolvidos no
projeto de proteção à vida selvagem, além da interação com o público visitante,
manutenção do local de trabalho e das trilhas, observação e estudo do
comportamento dos animais. No entanto, havia uma escala, pois tinha voluntários
da Inglaterra, Alemanha, Arábia Saudita, França e da própria África do Sul. Lá
havia, além dos leões e tigres, linces, gambá e suricato. A matriarca se
chamava Fat Mama.
Cãopetente – Onde ficam hospedados?
Vanessa
Serrão - Nós ficávamos dentro da reserva, e o dormitório
dos voluntários ficava próximo ao local onde vivem os leões adultos, então
dormíamos ao som do rugido deles! Uma experiência que jamais esquecerei! Como
parte desse trabalho, visitamos uma creche na região e levamos doações.
Cãopetente – Existe um período mínimo para realização dessa
atividade?
Vanessa
Serrão - O mínimo para realizar um trabalho voluntário
lá é de 15 dias, mas no site www.volunteerabroad.com há os mais variados tipos de
voluntariados em quase todos os locais do mundo.
Cãopetente – Tem vontade de voltar, Vanessa?
Vanessa
Serrão - Tenho muita vontade de voltar e
participar de um projeto com elefantes em outra reserva, mas confesso que estou
tão envolvida com a causa animal por aqui, que dificilmente realizarei este
projeto.
A Vanessa também atua como protetora
de animais no Rio de Janeiro e pratica equitação. Mas essas histórias a gente
conta depois.
Trabalho pesado, experiência inesquecível e um alerta importante
Marilena Cantizani, como foi
dito acima, já faz parte da nossa matilha há algum tempo. Nós a entrevistamos
por causa do trabalho que desenvolve na ResGatinhos, em Campinas. O nome já diz
tudo, não é mesmo? Se ainda não leram sua entrevista e a de Matilda e Maria
Mienta, cliquem nos links abaixo por que vale muito à pena. http://caopetente.blogspot.com.br/2013/10/protetores-de-animais.html
e http://caopetente.blogspot.com.br/2013/11/matildae-maria-mienta.html.
Na sua viagem à África do Sul, ela deixou os pequenos gatinhos para cuidar de outros bem maiores. Marilena viajou em 2011 e
explicou que muitas das informações passadas por ela podem estar
desatualizadas, porque o parque para onde foi está em outro lugar. Trata-se do
Kingdom of the White Lion. No fim das entrevistas, colocamos alguns links para
os interessados pesquisarem. Mas nosso amigo Google nos dá incontáveis
resultados.
Dentre as mudanças que Marilena
cita é que o Parque ainda se mantém em uma área próxima de Johannesburg, no
entanto num local ainda maior “e
adjacente a um grande parque de preservação ambiental/animal, com o qual também
trabalham. Inclusive os voluntários
agora têm a oportunidade de trabalhar também com os Big Five - leões, búfalos,
rinocerontes, elefantes e leopardos - desse parque, além dos animais do
Kingdom.”
Cãopetente
– Conte-nos como foi
essa experiência e porque quis ser voluntária em um Parque que abriga animais
selvagens.
Marilena
Cantizani - Fui para
o Kingdom of the White Lion, a cerca de uma hora de Johannesburg, África do
Sul. Viajei em outubro de 2011, e fiquei duas semanas no santuário. Tudo
começou em 2009, quando assisti no YouTube um vídeo sobre um homem e seus
leões: Kevin Richardson. Digitei o nome dele no Google, buscando mais
informações, e descobri o site do Kingdom (http://www.lionwhisperer.co.za).
Eles estavam começando com o programa de voluntários, e fiquei animadíssima!
Sempre assistia programas no Animal Planet e via esse pessoal trabalhando em
reservas e santuários, e morria de inveja, hehe. Prometi a mim mesma que iria,
mas ainda levou um bom tempo para conseguir me organizar, tanto profissional
quanto financeiramente.
No
início de 2011 entrei em contato com eles (info@lionwhisperer.co.za) para obter mais
informações sobre o que era necessário para me tornar uma voluntária. Quem me
respondeu foi Mandy, a esposa do Kevin. Ela me passou os formulários para
preencher, os valores, dicas de roupas a levar, vacinas a tomar (febre amarela,
antitetânica, hepatite), um livreto com informações sobre a África do Sul e a
região, enfim, todas as dúvidas foram tiradas por ela. Brasileiros não precisam
de visto para a África do Sul.
Marilena Cantizani - À época, optei por fazer o pagamento direto
para eles e foi dividia em duas vezes no cartão de crédito), apesar de haver
outras opções. Pelas duas semanas paguei cerca de 860 euros. Esse valor é pelo
programa de voluntariado, e inclui acomodação e traslado de e para o aeroporto
(a cotação do Euro hoje, 21/02/14, está R$ 3,23). A alimentação é por nossa
conta, eles nos levam ao supermercado uma vez por semana para comprar
mantimentos e preparamos nossas próprias refeições no alojamento. Gasta-se entre
ZAR500-800 (US$50-70) em mantimentos por semana. Passeios extras também não
estão incluídos. A passagem aérea, vôo direto São Paulo –Johannesburg, saiu na
época US$800,00 pela South African Airways. São oito horas de voo. Gostei muito
da linha aérea. O pessoal do Kingdom está te esperando no aeroporto quando você
chega.
Marilena Cantizani - Na
época em que fui eles ofereciam voluntariado de duas ou quatro semanas. Hoje é
mais flexível, oferecem desde uma semana até dois meses ou mais. Não havia
limite de idade. Mas sei que a maioria dos programas de voluntariado tem um
limite, geralmente 40 anos. Os voluntários vêm de todos os cantos do mundo, e o
inglês é a língua oficial. Sem ele fica difícil se comunicar e entender o que é
preciso ser feito. Na época em que fui o número de voluntários era limitado a oito pessoas, devido à quantidade
de camas disponíveis no alojamento. Uma casa linda com dois quartos, três banheiros,
sala e cozinha. Há uma máquina de lavar roupa, e uma pessoa do santuário faz
uma faxina geral, uma vez por semana. Homens e mulheres dividem esse espaço,
mas quando fui éramos sete mulheres. Eles recebem voluntários o ano inteiro,
mas não recomendo nem o inverno (muito gelado) nem o verão (muito quente e
muita chuva). Em outubro, quando fui, é primavera. Nesta estação tínhamos que
usar um agasalho logo cedinho e no final do dia, porque a temperatura caía
bastante. Mas na segunda semana o calor chegou pra valer. Teve dia que atingiu os
40ºC. Tive muita sorte e não peguei nenhum dia de chuva.
Cãopetente – Como é o Kingdom?
Marilena Cantizani - O
Kingdom abriga leões, hienas e leopardos negros - estes em menor número devido
ao custo de se construir cercados apropriados para eles, que como gatos escalam
qualquer coisa. São mantidos separados em cercados enormes, com aproximadamente
10ha (100.000m2), e há uma área central com cerca de 25ha onde os
animais são acomodados em modo de revezamento a cada duas semanas. Isso permite
que os animais mudem de ambiente, percorram áreas maiores, e evita que fiquem
entediados. A maioria dos animais é adulta, de vez em quando há filhotes. Eu
tive sorte, pois quando fui eles tinham dois filhotes de hiena e dois de
leopardo.
Mas
o objetivo do santuário não é a procriação, pelo contrário, eles lutam contra a
procriação em massa de filhotes de leões que hoje é feita na África do Sul para
fins comerciais, tanto de turistas como dos próprios voluntários, que estão se
tornando uma indústria em si. Depois que crescem normalmente acabam se tornando
presas em 'canned lion hunting', uma
prática horrível em que o leão é criado como se fosse gado, e depois de adulto
é solto em uma área limitada para que 'humanos' possam caçá-los, pagando
fortunas para isso. Os leões do Kingdom são ou castrados ou recebem injeção
anticoncepcional.
Cãopetente – Como é o trabalho dos voluntários?
Marilena Cantizani - Os voluntários podem interagir e
cuidar dos filhotes, mas não podem interagir com os animais adultos. Eles não
são 'mansinhos', e somente Kevin e alguns dos funcionários fixos do santuário
conseguem entrar nos cercados. O trabalho começa às 8h e vai até as 17h, oficialmente.
Mas é comum ter que ficar mais tempo. Há intervalo de uma hora para o almoço. O
trabalho braçal. O começo do dia é o mais gostoso, pois é quando alimentamos os
filhotes. Como eu disse, tínhamos dois filhotes de hienas, que são bem mais
tímidas, e os filhotes de leopardo, que são gatos tamanho gigante, e tão
brincalhões e louquinhos quanto, hehe.
Temos
que preparar e dar as mamadeiras, e eles também já estavam comendo pedacinhos
de carne. Limpamos o cercado, recolhemos fezes, colocamos água fresca,
brincamos com eles, levamos muitos arranhões, mas é demais! Os filhotes já
tinham cinco meses, e novinhos assim já eram enormes, então precisamos tomar
cuidado mesmo sendo filhotes, porque se distrairmos eles podem machucar mesmo
sem querer. Eles querem brincar e não têm noção da força que já tem. Depois
disso, cada dia tem uma tarefa, varia sempre e depende da necessidade do
momento: percorrer as trilhas procurando por armadilhas ilegais, cortar e
recolher mato seco pra fazer queimada, cavar e juntar terra para cobrir buracos
na estrada, fazer limpeza das instalações e dos cercados dos animais, cortar
carne em pedacinhos para os filhotes, alimentar os animais adultos que normalmente
são alimentados duas vezes por semana. Aí, no dia seguinte temos que limpar e
lavar o lugar onde eles comem. No final do dia, alimentar os filhotes
novamente. É exaustivo, todo mundo cai na cama super cedo, hehe. O trabalho no
sábado é opcional, mas todo mundo sempre trabalha. E o domingo é folga, daí
podemos ficar de bobeira ou fazer algum passeio turístico. Nós fomos passar o
dia em um hotel onde é possível fazer cavalgadas, alimentar elefantes, ver
zebras, hipopótamos, etc.
Marilena Cantizani - Tive que engolir seco muitas vezes, e
segurar as lágrimas. Os animais são alimentados, na maior parte das vezes, com
carne de cavalo. Normalmente animais velhos, doentes, ou que quebraram uma pata
e foram sacrificados, e que são doados para o santuário. E também com frangos e
pintinhos. Para quem é vegetariano foi difícil, principalmente ver centenas e
centenas de pintinhos mortos (descarte da indústria, que não se interessa por
pintinhos machos - não botam ovos - e os matam em câmaras de gás), e depois ter
que manusear aquela carne para oferecê-la como alimento aos animais. A pior
parte do dia era ter que entrar no frigorífero, nunca vou esquecer do cheiro
horrível que era lá dentro.
Cãopetente – E quanto às outras pessoas
voluntárias? Foi bacana a convivência?
Marilena Cantizani - Tive muita sorte com minhas
companheiras de voluntariado. Eram pessoas muito bacanas e não houve qualquer
problema de convivência. Estavam presentes Inglaterra, França, Alemanha, Suíça
e Hungria, e eu do Brasil. Para mim foi um privilégio poder conviver com
pessoas de lugares e culturas tão diferentes, e todas com o mesmo amor pelos
animais. Esse mesmo amor pude ver em todos que trabalham de modo permanente no
santuário. É um trabalho difícil, por vezes perigoso, mas eles estão sempre
sorrindo e de bom humor, e tem uma enorme paciência em ensinar os voluntários o
que precisa ser feito. Às vezes eu tinha a impressão que a gente mais
atrapalhava do que ajudava, quer dizer, o tempo que eles levavam explicando, ou
andando mais devagar para que a gente pudesse acompanhá-los, eles fariam a
tarefa na metade do tempo!
Foram
as duas semanas mais incríveis e intensas da minha vida, e eu com certeza
adoraria ser voluntária novamente, estou pesquisando outros lugares para onde
possa ir.
Cãopetente – Você fez um alerta sobre a
utilização de animais para fins comerciais e de caça. Qual o alerta que pode
nos dar sobre isso?
Marilena Cantizani - como eu disse acima, o voluntariado
está se tornando uma indústriai. Alguns lugares estimulam a procriação para que
sempre haja bebês para os voluntários cuidarem. Também fiquei sabendo sobre
locais em que os bebês são separados das mães com poucos dias, para que
acostumem com humanos. E até mesmo locais que mantêm os animais ligeiramente
dopados para que seu manejo seja fácil. Então é preciso tomar muito cuidado e
fazer uma pesquisa profunda antes de se voluntariar em qualquer lugar. É
interessante entrar em contato com pessoas que já foram voluntárias lá e podem
dar um relato real de como a coisa funciona.
É
maravilhoso cuidar dos bebês e poder interagir com eles, mas quando me inscrevi
no programa eu sabia que talvez não houvesse bebês para cuidar, foi realmente
uma questão de sorte encontrar os quatro filhotes. É importante lembrar que o
objetivo do voluntário é ajudar na preservação e bem estar de espécies que
estão sofrendo com o domínio e destruição dos homens, e que não estão ali para
entretenimento.
Alguns links relacionados ao assunto
http://www.lion-park.com/
http://www.statravel.com.au/tours-and-treks/Africa/Kingdom-of-the-White-Lion-Experience--1-STA_3x2rj
http://www.seaviewpredatorpark.com/
http://country.southafrica.net/sat/content/pt/br/what-to-do/the-great-outdoors/wildlife-and-safari/projetos-voluntarios-para-cuidar-da-vida-selvagem/
https://www.facebook.com/lionpark?ref=ts&fref=ts
Onde está o Zeus???
Vocês devem estar se perguntando: cadê o Zeus? Ele nem apareceu na introdução... É que quando ele viu as fotos dos "bichinhos", resolveu ir tirar um cochilo. Ou fingir que estava tirando um cochilo. E será por que ele colocou a bola ao seu lado? rsrs. Sei não. Acho que o cachorrão ficou mesmo foi apavorado!!!! E sabem do que mais? Tô achando que rolou um certo ciúme de tantas fotos lindas... Zeus, meu filhotão, eles são lindos, mas você é que é meu verdadeiro amor!!!
Até mais ver!
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