Vale tudo para salvar a vida de um animal sob maus-tratos?
“Se dá para roubar, eu roubo e fim.”
Algumas entrevistas com protetores de animais já foram publicadas no Cãopetente. O ponto em comum que encontramos em todos que se dedicam a essa causa é a obstinação. Alguns vão até às últimas consequências para salvar uma vida. O que pode ser questionável ou controverso para alguns é, para essas pessoas, ponto indiscutível e sem negociação, principalmente quando se deparam com recusas ou burocracias de instituições públicas.
Como a
maior parte dos entrevistados do Cãopetente, conheci a Adriana por meio da
página de um conhecido no Facebook. Ela anunciava a venda de plaquinhas identificadoras para cães e eu me interessei em comprar uma para o Zeus.
Inclusive, porque ela anunciava que o dinheiro da venda era utilizado para os
cães que abriga ou que mantém em outros locais. Abri sua página e vi que
trabalha como Dog Walker, mas que a atividade de protetora também faz parte da
sua rotina. Comprei a plaquinha e, inclusive compartilhei seu anúncio na página
do Cãopetente no Facebook.
Adriana
Breves do Santos é mais uma pessoa que exerce a atividade de proteção aos
animais e que me causou curiosidade em conhecer sua rotina e dividir as
informações com vocês. Nossa entrevistada se mostra, tanto na sua página
pessoal, quanto na sua entrevista, muito destemida, corajosa, bastante sincera
e não escolhe palavras para dizer o que pensa. Perguntei à Adriana se realmente
não havia problema em publicar tudo o que declarou e ela não titubeou. Afirmou
objetivamente: “pode sim, sem problema algum”.
Da parte
do Cãopetente é ótimo poder mostrar de maneira clara e transparente o que as
pessoas pensam e como agem. E torcer para que as dificuldades diminuam quanto
maiores forem as informações. O fato é que não é nada fácil exercer a atividade
de protetor de animais. Essas são pessoas de alma nobre e sentimentos fortes!
Adriana
tem 37 anos e suas respostas mostram grande determinação quando se trata de
resgatar um cão ou gato, cuidar e colocá-los para adoção. Bem como nas afirmações que mostram que, na sua opinião, a responsabilidade pela vida de todos os abandonados e maltratados animais são de todos e não só daqueles que escolhem exercer no seu dia a dia a função de resgate, acolhimento e doação. Adriana está sempre
ao lado de um desses bichinhos, já que trabalha como passeadora de cães. Nasceu em São
Paulo e sempre morou no Ipiranga. Ela conta como se tornou uma protetora. “Eu
tinha um fotolog. Vi um pedido de ajuda. Uma moça vendia camisetas. O dinheiro
das vendas era para comprar os remédios. Fui com meu irmão na casa dessa moça,
compramos camisetas e levei algumas doações. Só que história que vi não era
dela, mas tinha o email dela... Acabei indo numa feira de adoção onde eu ficava
cuidando dos animais. Fui em mais duas ou três feiras. Logo, o grupo se
dissociou.“
Adriana e
mais duas pessoas que fazem parte da atual formação, então se juntaram e começaram
a realizar novas feiras com o mesmo nome do grupo da moça do início da história: União SRD (sem raça definida). “Daí começou: feiras e mais feiras,
resgates e adoções. Crescemos e nos organizamos. Criamos um logotipo e demos
ênfase ao nome que já existia”, explicou.
Cãopetente - Há quanto tempo trabalha como Dog Walker ou em
português mais claro, passeadora de cães?
Adriana Santos - Há quatro anos.
Cãopetente – Por que decidiu trabalhar com cães?
Adriana Santos - O convívio com animais acabou levando para esse
lado. Sempre via que a profissão podia ser promissora em revistas e na mídia.
Também estava desempregada e uma coisa acabou levando a outra.
Cãopetente - Em qual região de São Paulo você atende?
Adriana Santos - Bairro do Ipiranga, Vila Mariana e bairros próximos.
Cãopetente – Fale sobre sua rotina profissional.
Adriana Santos - Os passeios duram em média 30 minutos, são dois
clientes avulsos e dois juntos. No começo idealizei um contrato, mas como os
clientes foram todos surgindo por meio de indicação, acabaram se tornando
amigos. Hoje não tenho contrato. No dia de pagamento, o dinheiro está na minha
conta.
Os mesmos
clientes acabam optando por mim nos serviços de hotel ou creche, e também na
atividade de pet sitter.
Cãopetente – Quantos animais de estimação você possui? Fale sobre eles.
Adriana Santos – São quatorze. Dez são meus e quatro para adoção. São
todos umas ‘pestes’... rs.
Cãopetente – Vamos falar sobre a atividade de protetora. Onde
abriga os animais que resgata? Possui um lugar específico ou clínicas que lhe apoiam?
Adriana Santos - Quando dá, ficam em casa. Mas a maioria fica em
canil ou hotel particular.
Cãopetente - Tem mais pessoas que trabalham com você?
Adriana Santos - O grupo União SRD é formado por três mulheres.
Cãopetente - Desde quando você decidiu ser protetora de animais?
Adriana Santos
- Quando
comecei a ajudar a Ong União SRD e foi acontecendo naturalmente. Há dez anos.
Cãopetente – Lembra-se do primeiro animalzinho que você ajudou e
em quais circunstâncias?
Adriana Santos
- Foi um
poodle da feira para onde fui como voluntária. Consegui dono pra ele. Só que as
protetoras largaram o cão comigo, sem sequer desejar saber se o adotante era ou não
bom. Foi para uma amiga de Orkut na época que ficou com o cão muito tempo. Ele
morreu há uns dois anos.
Cãopetente - Abriga apenas cães ou possui outros animais?
Adriana Santos
- Somente
cães e gatos.
Cãopetente - De que forma os animais chegam até você?
Adriana Santos
- Geralmente
são denúncias de maus-tratos. Às vezes passando na rua nós identificamos alguma
situação e vamos investigar. As pessoas ligam a semana toda querendo que
resgatemos animais que elas encontraram. A resposta é sempre NÃO!!! A não ser que
seja um caso especial que por ventura possamos ajudar, mas é muito difícil. Recusamos
a maioria. Se eu vejo a situação é meu dever resgatar. Agora se você viu, é
dever seu, não meu. Porque o que eu faço, você também pode fazer.
Cãopetente - Qual a maior demanda? Filhotes, animais adultos
ou idosos?
Adriana Santos
- Acho que
os três estão equiparados. Abandonam caixas cheias de filhotes; os idosos
justamente porque ficaram idosos e não querem gastar com algum tratamento; e os
adultos porque cresceram ou porque as pessoas são más mesmo.
Cãopetente - Quais são suas maiores dificuldades?
Adriana Santos
- A maior
dificuldade hoje é local para os animais e dinheiro para manter com qualidade
os já existentes.
Cãopetente - Tem parceiros veterinários?
Adriana Santos
- Sim,
temos alguns. Ou não nos cobram a consulta e só os procedimentos, ou vice-versa.
Ou ainda nos dão alguma facilidade para pagar. Mas temos
que pagar de uma maneira ou de outra. A gratuidade até acontece, mas muito
raramente.
Cãopetente - Tem alguma parceria para castrar e medicar os
animais que ficam para adoção?
Adriana Santos
- Todos os
procedimentos para os cães que vão para o canil, geralmente são feitos por
eles. Temos também uma conta e vamos pagando conforme entra o dinheiro. Para
aqueles que ficam em hotel, pesquisamos os locais onde os procedimentos fiquem
mais em conta.
Cãopetente - Como faz para conseguir rações e medicamentos?
Adriana Santos
- Geralmente
com apelos na internet. Alguns tem madrinhas e padrinhos para quem podemos
pedir; e nas feiras de adoção fazemos a arrecadação de ração.
Cãopetente - Como planeja as feiras de adoções?
Adriana Santos
- Hoje elas
são fixas. Acontece aos sábados, já com datas definidas até o fim do ano. Somente
uma delas é em pet shop, que naturalmente é nosso parceiro.
Cãopetente - Além das feiras, quais os canais de divulgação
para adoção?
Adriana Santos
- Cem por
cento internet. Nosso site, Facebook e mailing de email. Às vezes, alguns sites
de adoção de terceiros.
Cãopetente – Tem algum caso que te emocione mais?
Adriana Santos
- São
vários, não tem um específico. Já pegamos uma cachorra desfalecida, que ninguém
dava nada por ela e hoje está doada e linda. Uma boxer quase morta, com um prato
de comida podre e água preta. Ela não andava e hoje também foi doada e está com
a saúde ótima. Dois cães idosos em carne viva por causa de sarna. Viviam numa
casa com mais 14 animais. Várias ongs foram chamadas para cada uma assumir um animal.
Ninguém as queria por serem velhas. Pegamos, tratamos e uma foi doada ano
passado. Morreu este ano, mas teve a chance de conhecer uma família. São vários
casos no mesmo patamar.
Cãopetente - Alguns cuidados precisam ser tomados ao abordar
um cão. Afinal, principalmente aqueles que são maltratados ou nas ruas ou pelos
donos, às vezes atacam por medo. Ou mesmo fogem. Como você procede?
Adriana Santos
- Eu ando com
comida no carro e na bolsa. Petisco, guia, coleira e cambão. A gente tenta
atrair com comida e carinho. Muitos fogem. Corremos atrás e ele some. Aí é
entregar para o destino.
Cãopetente - Outro problema que imagino que possa fazer parte da
sua rotina é abordar as pessoas que maltratam seus animais e retirá-los delas.
Como você age nesses casos?
Adriana Santos – Hoje, com a experiência que tenho, eu roubo, pulo
muro, arrombo. Caso nada disso seja possível, a gente tenta enviar uma notificação
extrajudicial... Ou recorremos a alguns protetores ‘maiores’ que vão lá ameaçam
e tiram o animal. Em último caso acionamos a polícia, devido às burocracias.
Cãopetente - Você tem apoio do setor público para alguns casos?
CCZ,s, Polícia Militar, Bombeiros...
Adriana Santos – Não, nenhum. Polícia e Bombeiros dificilmente levam
os casos a sério. É raro algum deles ajudar. Sempre botam empecilho para não
virem. Por isso, no meu caso, se dá para roubar, eu roubo e fim.
Cãopetente - Depois que consegue um lar para seus animais, há
alguma forma de acompanhar se os proprietários estão cuidando de maneira
adequada?
Adriana Santos – Sim. O animal só sai das nossas mãos, após
assinatura e preenchimento de quatro termos de adoção, cada um cita uma coisa
diferente. Pedimos
xerox de documentos e o adotante paga uma taxa, que é revertida aos animais que
ainda não foram adotados. Depois ligamos, visitamos, pedimos fotos, até
acharmos que não seja mais necessário. Alguns a gente nem precisa pedir, estão
sempre em contato.
Cãopetente - Existem muitos casos de devolução? Se sim, quais
os principais motivos alegados pelas pessoas?
Adriana Santos – Existem. São poucos, mas existem. Pelos motivos
mais torpes: gravidez, mudança para apartamento, mudança de cidade - embora tudo
isso seja perguntado durante a entrevista de adoção. E ainda alegam que o cão
destruiu tudo, que mijou a casa toda... Claro: pegaram, largaram fechado em
algum canto e foram trabalhar. Não levam para passear, os animais não gastam
energia, aí dizem que ele não se adaptou.
Cãopetente - Atua também como ativista? Vi suas postagens
recorrentes no caso do Instituto Royal e percebi que acompanha intensamente.
Dê sua opinião sobre esse caso.
Adriana Santos - No início da carreira eu atuava mais. Ia às
manifestações, mas hoje em dia não mais. Virou meio que uma disputa de egos, qual
protetora pode mais. Então divulgo via 'net' pra que a informação chegue a todos.
Nesse caso da Royal quis muito ir. Mas foi muito em cima da hora, nem tinha
como sair na madrugada e migrar pra lá... Isso é mais pra ativista 100% mesmo. Se
eu não precisasse trabalhar no dia seguinte, iria. Eu tinha dois carros
disponíveis na porta e poderia encher de cachorro (rs). Mas sou a favor das
manifestações. Só assim conseguimos fazer chegar nosso recado às pessoas.
Essa é a
Adriana, protetora de animais. Ao Cãopetente, não cabe nenhum tipo de
julgamento sobre uma ou outra decisão que leve ao salvamento de animais que
estão abandonados ou sob maus-tratos. Como alguém que adora os animais e
abomina todos os tipos de maus-tratos, tenho apenas duas coisas muito simples a
dizer: a primeira é que minha expectativa maior é que qualquer entrevista leve
às reflexões e ao conhecimento. Quem sabe, numa postura bastante otimista, que
leve à mudanças positivas de comportamento em relação ao trato dos animais. A
outra coisa a ser dita é que me sinto com a obrigação de agradecer a todas as
pessoas que, assim como a Adriana, são corajosas, obstinadas e não medem
esforços nem palavras para que alguns animais sejam tratados com a dignidade e
o respeito que todos deveriam ter naturalmente.
E para a
próxima?
Com
muitos entrevistados eu pergunto se há animais cujas necessidades de adoção
sejam especiais e a dificuldade se mostre maior que na maioria dos casos.
Sempre levamos para o Pet a Pet com o Zeus, como sabem todos que nos
acompanham. Eu ia fazer diferente dessa vez e colocar a entrevista do Zeus junto com esta, mas mudamos de
ideia, não é Zeus? Em breve vamos divulgar o Pet a Pet do Zeus com o Bob e a
Bia e suas AUnotações e considerações a respeito deste caso. Antecipo que esses
dois só podem ser adotados juntos.
Até mais
ver!